26 outubro, 2009

A mulher da bata e o cine Olido

Joana acordou tarde naquela manhã de feriado, queria fazer alguma coisa diferente naquele dia, não queria ficar o dia inteiro com seu pijama rosa de bolinhas e suas pantufas acariciando a gata. Olhou-se no espelho e pensou “Nossa!! Preciso Viver!”.
Joana tomou um banho demorado, perfumou-se, passou sua maquiagem de costume, sombra forte nos olhos, rímel escuro, batom vermelho e saiu. Foi em direção ao centro da cidade, tomou o metrô. Na saída Joana assustou-se, um bolo de gente estava parada em volta de alguém, era um homem que passava mal no chão, por algum motivo a multidão desviou o olhar para Joana, ela não entendeu por qual motivo mas seguiu seu caminho.
Ao chegar ao Cine Olido, Joana sentou-se mas o cheiro forte a incomodou, a sua frente sentou-se um senhor que cheirava muito mal, ele olhou para trás como que encantado, mas Joana achou um absurdo ser cortejada com o olhar por aquele homem, inquietou-se na cadeira e desviou o olhar, o homem desistiu da empreitada. O filme iniciou-se, mas aos cinco primeiros minutos, como num filme de terror o slide derreteu-se na tela. Joana começou a pensar que a sua tarde não estava andando bem. O filme recomeçou enfim, estava difícil agüentar o mau cheiro, mas ver as expressões da heroína italiana compensava. De repente uma trilha sonora diferente invadiu a sala do cine Olido, um homem roncava e ressonava atrás de Joana, muito tímida ela não pensou em tocá-lo de lá. Os eventos sucediam-se um após o outro, um outro homem perto de Joana fazia a tradução do filme lendo as legendas em voz alta e uma mulher soltava gargalhadas altíssimas nas horas mais impróprias para o trágico romance. A tarde de Joana ruía como ruía a heroína do filme. Na última cena eis que a legenda some, coitada de Joana, não sabia italiano, não agüentava mais o cheiro, o ronco, a gargalhada, mais foi forte, resolveu assistir o filme até o fim, persistente seria como era a doce heroína.
Finalmente acabou, Joana saiu do cinema com uma sensação estranha, todos a olhavam. Joana pensou que devia ser sua expressão de decepção e foi embora.
Quando chegava encontrou uma vizinha na porta de casa quase, ela veio olhando estranho para Joana com um sorriso no canto da boca.
- Joana?! Tudo bem contigo?
- Sim! – respondeu Joana já meio cansada daquele olhar.
- Amiga você está bem? Não acha que esqueceu nada em casa?
Joana pensou que estranha pergunta era aquela e então olhou-se, pela primeira vez no dia Joana olhou para si, e entendeu então as olhadelas da multidão, do homem do cinema e o sorrisinho da sua vizinha, Joana vestia uma bata verde curtíssima dessas para usar com calça justa, pantufas rosa e só! Esqueceu-se ao sair do chuveiro que ainda ia escolher a calça e saíra só de bata verde.
Joana entrou rapidamente antes que outros vizinhos a vissem, não sabia se ria de sua própria patacoada ou se chorava. Olhou-se no espelho e pensou: “Quer saber?! Não sou a primeira estranha a andar na cidade e não serei a última”. Joana riu-se, tirou a bata, já colocou o pijama rosa de bolinhas e foi sentar-se no sofá, ver qualquer coisa na TV, olhou bem para a gata que já vinha aconchegar-se e disse: “Cine Olido nunca mais!!”.

Escrito em 14/07/08.

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